DA RESTAURAÇÃO (extracto)
(Ultima intervenção política de Afonso Botelho)
…
No que diz respeito a este
sentido do poder absoluto, também a República nos confundiu noutro equívoco,
transformando em impulso emocional a divergência histórica entre miguelistas e
liberais. Para tanto, amputou a essa dramática oposição nacional os principais
valores que nela estiveram em jogo. Na realidade, a mais profunda causa do
desencontro histórico não residia na absoluta ou limitada acção governativa do
Rei, mas na manutenção ou rejeição de uma ampla ideia tradicional da origem do poder
e da genuinidade dos costumes e privilégios dos povos.
Era esse afinal o absolutismo que
o senhor Dom Miguel representava e que nasceu inseparável e unido ao
Cristianismo ocidental na sua raiz autêntica, inspiradora da lei fundamental do
Reino. Nesse sentido se elege ainda hoje a aspiração primeira do
tradicionalista de restaurar o poder e, digamo-lo claramente, a obrigação
prioritária do monárquico de restaurar o regime, que, em seu profundo
convencimento, é o único apto a fazê-lo.
Tomo esta obrigação, meus ilustres
e estimados Companheiros, não por uma abstracta dedução lógica, mas por uma
razão existencial: tomo-a com a urgência das situações terminais, porque
terminal me parece o ânimo dos portugueses em relação à própria necessidade do
poder político, a cujos esgotamento e aviltado exercício assistem revoltados.
Não creio que seja indispensável
invocar mais uma vez a conclusão daqueles politólogos americanos que denunciam
precisamente como sinais do termo da forma democrática vigente, todos os gravíssimos
problemas que a insanável oposição entre liberdade e igualdade criou.
Em Portugal, neste momento, já
nem é a perversão do poder que nos provoca, mas a sua quase total inexistência.
E a reacção a esta ausência cada dia se manifesta de uma forma mais clara e
alarmante, posto que esse significado não nos seja perceptível como verdadeira
realidade.
Efectivamente, a acção
degenerescente prolifera em actos que ainda não possuem a força que desencadeia
a revolução sangrenta, nem a concentração do golpe político, mas que denuncia a
angústia ameaçadora da sociedade que, impedida de se representar num poder
aprisionado pelo sistema, chama a si a sua força e as suas competências, se
substitui a ele, ocupa-o, partilha-o à margem da lei. Existimos realmente na
ordem e na estabilidade equívocas, que se processam entre uma partilha
indefinida do poder e um Estado que, para subsistir, sobrepõe ao poder a
omnipotência (na observação subtil de um comentador político).
…
Hoje, o nosso ponto de partida é
necessariamente reflexivo de início, mas logo devém operativo, de tal modo se
nos revela urgente restaurar o poder.
Como cidadãos ainda teremos de
cumprir as leis da cidade, porém sob reserva, porque nem a cidade dos nossos
dias é idêntica à polis grega, nem a lei vigente merece o sacrifício da vida de
Sócrates. Mas, como monárquicos, não dispomos outra vez de clima social e
político para protelar ou secundarizar a restauração da Monarquia.
Perante o que afirmamos ser,
redescobrir e restaurar o poder genuíno é finalidade que não pode
tranquilizar-se na normalidade democrática, nem ceder aos seus apelos
emolientes.
Em relação à sua força de
captura, tal como prisioneiro de guerra, o monárquico tem por dever prioritário
recuperar a liberdade, que, para o seu código de honra, antes de ser de si
próprio, o é dos destinos da Pátria.
7 de Outubro de 1995, no encontro anual da Liga Popular Monárquica, em Guimarães
"Da Restauração", in Boletim da Liga Popular Monárquica,
série F, nº 16, Outubro-Dezembro de 1995, pp. 9-11 e também in Consciência
Nacional, nº 187, Janeiro-Outubro de 1995, pp. 1, 3.
Reproduzido em http://www.angelfire.com/pq/unica/il_1995_afonso_botelho.htm a
partir de Gonçalo Sampaio e Mello, "Afonso Botelho, Legitimista"...., pp. 249-253.
Ver comunicação completa in http://www.angelfire.com/pq/unica/il_1995_afonso_botelho.htm
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