Os integralistas já só
necessitavam de um documento rubricado pelo Lugar-Tenente do rei para vencer as
hesitações que ainda houvesse entre os comandantes militares do Sul, do cerco
de Santarém e do Norte.
...Aires de Ornelas escreveu à
margem do documento: “Go on! Palavras d’El-Rei / Não vejo razão para
plebiscito / Não julgo difícil o reconhecimento / Aires de Ornelas / 14 Jan.
919”.
De imediato, e enquanto em
Lisboa, sidonistas de ontem, democráticos, unionistas, e socialistas, se
iam unindo ao governo de Tamagnini Barbosa, Paiva Couceiro seguia para o Porto
onde o aguardava terreno mais propício.
A Junta Central do Integralismo
Lusitano reuniu no dia 17 à noite. A decisão tomada é a de António
Sardinha e Luís de Almeida Braga partirem para o Porto, investidos com a missão
de “procurar suster o pronunciamento, até se ultimarem as ligações que viriam
dar-lhe maior caracter de unanimidade em Lisboa e na Província”.
António Sardinha chegou ao Porto
na manhã do dia 18, na véspera do pronunciamento, hospedando-se no Hotel
Borges; “ - Isto é um conto das Mil e Uma Noites!”, terá logo exclamado perante
o espectáculo da mais absoluta facilidade revolucionária que acabava de
encontrar. Pela tarde avistou-se com Paiva Couceiro, expondo-lhe os
motivos da sua viagem, a conveniência de aguardar mais uns dias para que o
pronunciamento das tropas, em Lisboa e no Porto, pudesse ser simultâneo”.
Couceiro alegou que não havia outra oportunidade, “não só porque, em Lisboa, os
comandantes militares, com as suas hesitações, continuariam no mesmo pé em que
se haviam mantido em seguida à morte de Sidónio, como, já conhecedor o Governo
do que se passava no Porto, não tardariam a ser substituídas por ele todas as
autoridades militares e civis”. No dia seguinte - dia da proclamação da
Monarquia - chegavam ao Porto, em comboio especial, acompanhados pelo ministro
da Guerra da República, Silva Basto, os recém-nomeados governador civil e o
comissário de polícia, respectivamente, António Pais e Cristóvão Aires.
Foram devolvidos a Lisboa sem tomar posse. Estava já hasteada no Monte Pedral a
bandeira azul e branca.
A restauração declarava em vigor a Carta Constitucional e indicava como chefes:
Luís de Magalhães, Sollari Allegro, Conde de Azevedo, Visconde do Banho,
Coronel Silva Ramos. A Junta Governativa do Reino ficava sob o comando de
Paiva Couceiro.
Logo que foi conhecida a
proclamação, o Integralismo Lusitano manifestou aceitar a nova ordem, agarrando
“a parte prática e positiva da obra restauradora” - Primum vivere,
deinde philosophare, era o princípio que adoptavam.
...O Norte estava dominado, mas
havia que restabelecer o contacto com as forças restauracionistas no Sul e
proceder à restauração onde tal fosse exequível.
Em Lisboa, na manhã do dia
seguinte à proclamação do Porto, Hipólito Raposo suspendeu o jornal A
Monarquia, seguindo de imediato para Belém, onde se estavam a concentrar os
monárquicos (Regimento de Cavalaria 2). Havia que subir a Monsanto para ocupar
o posto de T.S.F. e estabelecer contacto com o Norte.
Entretanto, a Junta Governativa
do Reino nomeara António Sardinha governador civil de Portalegre, com o intuito
e a esperança de aí se poder vir a proclamar a Monarquia. Sardinha ficará junto
de Paiva Couceiro, preso à missão prioritária de constituir o Gabinete da
Presidência. Agregou a si Luís de Almeida Braga, João do Amaral e Nosolini
Leão. Ter-se-ão sucedido dias tranquilos, mas sem notícias do Sul.
Até que aí surgiu António Teles de Vasconcelos, para montar os serviço de
comunicações ao longo da fronteira É então que Sardinha é destacado para
Badajoz, Luis Teles de Vasconcelos (irmão de António) para Cáceres, Joaquim de
Almeida Braga para Tui, de onde penetrariam em Portugal com propósitos
restauracionistas.
Em Lisboa, entretanto, pouco
passava das seis horas do dia 22 de Janeiro, quarta-feira, quando, do quartel
de Lançeiros, começaram a sair os cerca de 70 homens comandados pelo capitão
Júlio da Costa Pinto. O desfile dirigiu-se, a passo, pelo Alto da Ajuda até
Monsanto. Quando aí chegaram, fizeram acampamento na Cruz da Oliveira, onde
improvisaram um quartel-general, enquanto o capitão Delfim Maia ocupava o posto
de T.S.F. Distribuídas várias vedetas pelos locais de acesso, ali se revezaram
durante toda a noite nos turnos de sentinela.
Na manhã seguinte, dia 23, aos
primeiros raios de sol, o grosso da coluna dispôs-se em linha de atiradores
junto ao moinho do Alto da Peça. Dadas as salvas do estilo, hasteou-se a
bandeira azul e branca com “o símbolo real tremulando na altivez secular das
suas quinas”.
A ligação entre o Porto e Lisboa ainda terá demorado, com o alferes António
Pinto Castelo Branco, a repetir várias vezes a partir de Lisboa: «Aires de
Ornelas e tropas monárquicas em Monsanto, pedem noticias».
Estabelecido o contacto, mas
“receando a hipótese de um ardil de guerra, perguntavam do Porto:
Quem foi buscar Aires de Ornelas
a Carcavelos?
De Monsanto respondia-se
seguramente: «- António Sardinha».
Logo a seguir, recebia-se a
transmissão das boas noticias do Norte, em nome de Paiva Couceiro”.
O desastre de Monsanto ocorreu
logo no dia seguinte, 24 de Janeiro. Enquanto uns 30 monárquicos saíram
da Cruz das Oliveiras em direcção à Ajuda, para ir tentar sublevar o quartel de
Infantaria 16, os que ficaram no Monsanto não conseguirão suster as arremetidas
das forças republicanas, entretanto acrescentadas pelos numerosos voluntários
que responderam ao apelo do Governo. Os monárquicos, em clara desvantagem
numérica, ainda lutaram até ao fim da tarde. O capitão Júlio da Costa Pinto,
com alguns feridos graves sob o seu comando - entre os quais Pequito Rebelo e
Alberto Monsaraz - , acabou preferindo a capitulação à fuga.
António Sardinha, que nesse mesmo
dia deixara o Porto, seguindo por Espanha na direcção de Portalegre, só soube
da tragédia ao passar em Vigo, onde se demorou com Luís Teles de Vasconcelos,
antes de seguirem viagem por Astorga até Salamanca. Não chegará a entrar em
Portugal, sendo expulso de Badajoz a pedido do Cônsul de Portugal, por expressa
disposição do Governo espanhol, em 13 de Fevereiro de 1919. 0 desmoronar
completo do “efémero castelo de cartas” desses vinte e cinco dias da denominada
Monarquia do Norte, foi notícia que acolheu António Sardinha já em Madrid.
José Manuel Quintas
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