O Integralismo
adoptou a fórmula conhecida de Gama e Castro: “o Rei governa, mas não
administra”. Dado que a palavra Governo
se aplica hoje correntemente ao Conselho de Ministros e às suas atribuições de
administração pública, temos de distinguir deste sentido de governo, o governo
real, e de rectificar, portanto, a expressão. Contudo, melhor seria, para
evitar confusões, e por consagrado que está o termo, que se continuasse a
chamar governo à administração e ao
seu órgão responsável e que se dissesse que o Rei reina, pressupondo que reinar
pode ter um conteúdo diferente do que se lhe deu no Século XIX com o demo-liberalismo.
Em boa
doutrina, aliás de há muito aceite pelos monárquicos portugueses o Rei não deve
imiscuir-se, nem responsabilizar-se na administração. Não deve, nem seria
conveniente que o fizesse, porquanto os actos administrativos, andando por
natureza permanentemente sujeitos à crítica e à discussão da opinião pública,
expõem os seus responsáveis a um desgaste crescente e fatal.
Seria o maior
dos absurdos descer o Rei ao lugar de um Primeiro Ministro para se queimar e
inutilizar a curto prazo nessas funções subalternas.
Que papel
desempenha então o Rei?
Para que serve
no Estado moderno?
A mesma
pergunta fê-la, com o desplante e a grosseria de um novo-rico, o Presidente Teodoro
Roosevelt ao velho Imperador Francisco José da Áustria-Hungria. Este respondeu
à letra ao governante americano: - “a minha missão como rei é defender o meu
Povo dos seus Governos”.
Bela e
inteligente resposta que dá uma perspectiva nova à Realeza ante as tentaculares
e cada vez mais absorventes intromissões do Estado na vida dos Povos!
Porém, chegou
um tempo em que deve rectificar-se: a missão dos Reis é defenderem a Nação do
Estado.
“Procuradores
dos descaminhos do Reino”, intitulavam-se os nossos monarcas. Eis aqui uma
síntese feliz do encargo real.
O governo do
Rei traduz-se em impedir o desgoverno da Grei.
Mostraria não
apreender o sentido profundo e transcendente da Realeza quem visse nela uma
chefia de Estado apenas diferente da Presidência por ser transmitida hereditáriamente.
O Rei, em verdade, não pode considerar-se essencialmente um Chefe de Estado;
é-o apenas por inerência das suas funções, as quais têm um carácter eminentemente
nacional, enquanto a Chefia do Estado é de índole puramente política.
Do antecedente
já se vê que seria um erro crasso imaginar qualquer semelhança ou aproximação
entre uma Monarquia e uma República Presidencialista, tanto como confundir o
significado de Governo Real com as atribuições executivas de um Primeiro
Ministro ou as de um Presidente-Chefe de Governo.
O Rei é “a
Pátria com figura humana”, entendeu-o e disse-o admirávelmente o poeta. É desta
faculdade excelsa de personificar a Nação que na maior parte promanam as
magníficas virtualidades da instituição real. Tudo quanto possa restringir essa
faculdade limita e diminui os serviços da Realeza.
Rei – personificação
da Pátria,
Rei –
procurador dos descaminhos do Reino,
Rei – defensor
da Nação perante o Estado,
eis-nos diante
de três posições basilares que necessàriamente marcam, orientam e definem a jurisdição
ou magistratura real.
Mário Saraiva in Razões Reais, Biblioteca do Pensamento Político, 1970
Mário Saraiva in Razões Reais, Biblioteca do Pensamento Político, 1970
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